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Textos 01 de Álvaro Siza são como relâmpagos na serena tempestade dos dias. Todos conhecemos a expressão exterior de um homem discreto – que tem dedicado a sua vida à profissão de arquitecto com a genialidade do criador que é hoje reconhecida em todo o universo da arquitectura –, como a de uma das personalidades mais marcantes, mesmo ao nível da arte contemporânea. A obra aí está, pujante na sua materialidade concreta, no Porto, em Portugal e por esse mundo fora, aquém e além-mar. Servindo, em cada caso, ao uso e destino social para que foi programada mas, na dimensão simbólica que organiza a razão profunda das comunidades, contribuindo com passos precisos para o legado moderno na construção de cada história particular.
     Esta recolha de pequenos artigos, em geral preparados para outras publicações, revelam-nos o campo teórico em que se movimenta o autor, pondo em evidência a inquietude de cada momento em paralelo com o discurso directo da solidariedade para com os outros, amigos, colegas, admiradores. São extractos de memórias explicativas acompanhando a divulgação de alguns projectos em revistas e catálogos de exposições, discursos, homenagens e reflexões pontuais que, no seu todo, tornam completamente compreensível a matriz cultural e formas do pensamento de Álvaro Siza. Podem ler-se em sequência, como quem procura encontrar o argumento ou um fio de ideias. Ou, pelo contrário, abrir o livro a páginas tantas, ao acaso, e encontrar uma sugestão como um poema, aberto à interrogação das coisas e sucessos que nos acompanham. É como um livro de desassossego, poesia em prosa, confissões para uma outra qualquer doutrina de pensamento livre sobre as razões da arte e da vida.
     O que impressiona na personalidade latente que podemos intuir do autor destes textos, é o permanente sentido didáctico das considerações sobre o Eu, como que procurando transferir as constantes homenagens que lhe são devidas para o universo de preocupações comuns aos arquitectos, na convicção de que as descobertas assumidas colectivamente podem mais facilmente gerar o progresso em benefício de todos. Não é um discurso unitário de afirmação das razões pessoais mas um questionar permanente que apela à atenção crítica do leitor quando, sugerindo-lhe o que pensa, obriga a reflectir em consequência dos episódios narrados ou das interpretações avançadas sobre trabalhos realizados no constante labor do quotidiano.
     Optou o editor, Carlos Campos Morais, por organizar o material seleccionado segundo uma lógica temática muito aberta, de que nos dá conta num índice remissivo final, que lhe serve para uma espécie de classificação ideológica, nem sempre completamente compreensível. Na mesma linha de facilitar ao leitor a compreensão dos conteúdos, extrai de cada texto uma só frase com a intenção de induzir quem lê na direcção que lhe parece mais pertinente. Não vem daí nenhum equívoco à leitura, mas também esse aspecto não parece relevante, tendo em conta a força intrínseca da linguagem que percorre o livro, entre o coloquial e o intimista, mas sempre carregada de intenção esclarecedora sobre os fundamentos da arte da arquitectura.
     O facto de se abdicar de um critério cronológico integral, adoptado apenas dentro de cada sequência temática mas alternando constantemente os textos das diferentes classificações, misturando as brevíssimas reflexões poéticas com os descritivos mais longos e outras passagens de comentário opinativo, torna a leitura muito fácil e, a cada passo, mais estimulante. Resulta uma variação rítmica que casa bem com a própria obra arquitectónica de Siza, que é sempre do conhecimento de quem se interessa pelo livro e constitui, afinal, um poderoso instrumento para a clarificação imediata dos argumentos implícitos na matéria escrita. Em particular, a distribuição dos textos classificados como “Outros arquitectos” ao longo de todo o livro revela-se particularmente interessante na construção do equilíbrio entre a afirmação de ideias próprias e a consideração dos méritos alheios.
     Depois do aparecimento do livro As Cidades de Álvaro Siza, editado em tempo da Porto 2001, Capital Europeia da Cultura, pela Livraria Figueirinhas, esta iniciativa da Civilização Editora revelou-se particularmente oportuna, porque colocou ao dispor do leitor a versão em português de muitos textos já publicados por várias editoras em italiano, catalão, castelhano e francês, a que acrescenta muitos inéditos. Na verdade, contando-se em geral como habituais interessados na obra arquitectónica de Álvaro Siza, arquitectos e outros intelectuais de um universo atento às publicações que vão aparecendo por essa Europa fora, ou mesmo mais longe, importa respeitar o interesse do leitor em português por estas matérias. E, neste caso, acrescenta a qualidade da edição, quer quanto à elegância da expressão gráfica, quer quanto à legibilidade geral da matéria apresentada. Fica, assim, a aguardar-se o aparecimento de um novo livro, Textos 02 de Álvaro Siza, como o segundo de uma longa série.|

 


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